utopias

Sinceramente, eu gostaria muito de compreender o que de fato é o amor pronunciado por muitos, ensinado pelas religiões, testemunhado nas mais antigas histórias. Aquele amor altruísta, totalmente desinteressado, que doa-se o que tem para beneficiar o próximo, que aquece aquele que sente frio, que alimenta aquele que sente fome, que sacia aquele que tem sede, que estende a mão sem esperar as recompensas. Gostaria mesmo de saber onde se esconde em nossos dias, o amor ensinado por Jesus nas escrituras, que acolhe os órfãos, as viúvas, os mendigos, os idosos, os deficientes, os negros, as minorias, os que não tem dinheiro, os que não tem um carro top... Pouco a pouco eu percebo que é muito fácil amar aqueles que se sobressaem, que tem algum destaque, que tem o que oferecer em troca. É muito fácil reservar horas do dia para ouvir conversas divertidas, relatos de viagens, conselhos de qual loja comprar, de quais restaurantes frequentar. Um “amor” decadente, que se ocupa tanto do material, e se torna apático ao essencial. Um “amor” profícuo, que não encontra tempo para ouvir um desabafo, para fazer uma oração, para dar um conselho, para prestar uma simples ajuda. E enquanto isso vamos singrando por mares agitados a procura de “salva vidas”, vamos caminhando cansados no deserto a procura de uma única sombra, vamos sobrevivendo a tempestades a espera de um abrigo. Enquanto isso, a vida continua... não é mesmo? As metas ainda precisam ser cumpridas, as contas ainda precisam ser pagas, os contratos precisam ser assinados, a casa precisa ser arrumada, os livros precisam ser lidos, os eventos precisam ser planejados, os quadros precisam ser pintados... Mas enquanto se pinta quadros, sorrisos perdem a cor. Enquanto se planeja eventos, muitos planos se despedaçam. Enquanto se lê livros, se assina contratos e se cumpre metas, olhares perdem o brilho, corações se tornam solitários. Enquanto se arruma a casa, existem muitas histórias desarrumadas, muitos sentimentos fora do lugar. Porém, quem se importa de fato? Quem quer ouvir? Quem pode ou quer ajudar? Sinto-me exausta de tanta hipocrisia, sinto-me cansada de tantos discursos bonitos mas que não passam de discursos prontos e vazios. Nada acrescentam, nada oferecem, nada contribuem... Discursos frívolos que idealizam abraçar o mundo, mas que não são capazes de abraçar o que está mais perto. Discursos que prometem exterminar a fome, promover a paz, mas que não se materializam em pão e conforto para os mais próximos. Verdadeiras utopias... E é exatamente assim a vida, a estrada, a música, a viagem, a noite, a guerra, a solidão, o vazio, o inverno, a seca, a dor, o silêncio, a espera... Nunca compreenderemos... Prosseguiremos sentindo os ventos, as pedras, os calos nos pés, as indiferenças, as ausências, até a eternidade... E até lá, infelizmente, acabamos por nos tornar seres blindados, , tentando a toda custa nos proteger das falsidades, das mentiras, das ilusões e decepções da jornada. Nos tornamos soldados feridos guerreando as nossas batalhas particulares e subjetivas, lutando, ainda que com poucas forças, para sobreviver e chegarmos inteiros até o fim... Simone Contelli

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